Não posso impedir-me de acreditar que uma parte do povo português quer uma mudança, só não sabendo bem que tipo de mudança. Porém é idubitável que pretende uma mudança. Esta minha interpretação fundamenta-se no facto de cerca de 20% da população ter votado, nas últimas presidenciais em candidatos não alinhados partidáriamente, reforçando o facto de, nas anteriores eleições, 20% já o terem feito com o voto no candidato independente Alegre. Talvez sejam os mesmos eleitores, talvez não, mas a percentagem é sensivelmente a mesma.
Quero acreditar que estas pessoas gostariam de ouvir um discurso mais ou menos assim:
Caros concidadãos
Chegou o momento de todos assumirmos as nossas responsabilidades, chegou o momento de ouvir toda a verdade, por muito dura que ela vos possa parecer. Chegou o momento de não termos mais ilusões sobre as soluções que nos são sucessivamente apresentadas. Sendo o trabalho dos politicos o de redistribuir a riqueza produzida, justa e equitativamente, assim assegurando a continuidade das suas carreiras politicas, o momento que vivemos é grave porque já não existe (há muito) riqueza para distribuir.
O momento é também grave porque, em consequência, a maioria da população deixou de ser livre porque não tem dinheiro para pensar livremente. Por essa mesma razão provávelmente, a maioria tornou-se dependente do Estado, quer o seja pelo trabalho, quer o seja por subsidios, quer o seja por negócios que efectua com o Estado. Este Estado, o Estado que temos, tornou-se uma ténia intestinal e como as ténias ganhou uma dimensão que a faz absorver toda a riqueza criada pela sociedade, deixando-a cada vez mais fraca.
Para justificar a sua prepotência o Estado produz legislação sobre legislação, procurando dar a impressão que está atento aos problemas e que está a fazer alguma coisa para os resolver, quando na realidade está a complicar ainda mais a vida dos portugueses e a criar e a incentivar corrupção. Publius Cornelius Tacitus, historiador Romano, disse 200 anos antes de Cristo: ‘’um Estado é tanto mais corrupto quanto maior for o numero das leis que produz’’. A democracia portuguesa transformou a sociedade numa selva onde as leis já entupiram o sistema judicial e lhe retiraram a sua razão de ser, fazer justiça. As leis que, sofregamente, cada legislatura produz, induzem mais corrupção, pelo que o problema não está na própria corrupção antes está no Estado por via da quantidade de leis que produz.
Não precisamos de politicos a prometer mais leis para melhorar as nossas vidas, precisamos de um compromisso real para eliminarem muitas delas e correspondentes regulamentos para um nivel que possam ser de conhecimento acessível a todos, dando cumprimento a um principio fundamental (que não se verifica agora), de que ninguém pode alegar o desconhecimento da lei. Para que isto venha a ser verdade precisamos de bom senso e de um compromisso de Estado, para eliminar toda a legislação não fundamental e um regresso à gestão desse Estado como bom “pai de família”, recuperando leis naturais que são do conhecimento de todos, regras que não necessitam estar escritas, sobre responsabilidade, competência, boa educação, moral e bons costumes, que têm sido ignoradas, esquecidas, com tendência a desaparecer.
Os governos tornaram as populações irresponsáveis com a ilusão de que estão lá para nos proteger e que o estão a fazer com empenho. A melhoria das condições de vida não são reflexo de bom governo, são antes resultado do crédito e do endividamento que as populações decidiram assumir.
Será que acreditam nos governos quando prometem mais emprego ou mais soluções para que seja criado esse emprego? Não seria melhor ouvir dizer que não compete ao Estado estar a criar emprego, porque para o fazerem estão a criar mais custos à sociedade?
Será que podem acreditar em promessas de politicos quando `vêm que os nossos reformados vivem, na sua grande maioria, abaixo do limiar da pobreza e vão sendo enganados com aumentos irregulares de 1 ou 2% que, com optimismo, correspondem a alguns cêntimos mais no fim de cada mês? Não seria melhor ouvir os politicos explicar que os benefícios da reforma estão assentes num sistema em pirâmide em que é preciso que haja muito mais gente a trabalhar que aqueles que se reformam e que como isso não se verifica e não parece possivel, o resultado vai ser invariavelmente as pessoas terem que trabalhar cada vez até mais tarde e receberem cada vez menos chegada a hora das suas reformas?
Portuguesas e Portugueses vamos parar de olhar apenas e passar a ver com mais atenção, para assim assumirmos as nossas responsabilidades. Assumir que somos responsáveis por viver numa abastança permitida pelo crédito, por exigir direitos que sabemos não poderem continuar, por continuarmos a ter um padrão de vida que não se coaduna com padrões de risco enquadrados em bom senso, por termos deixado de ser diligentes e pouco estudiosos trocando tudo isso por passar o tempo a ver televisão.
Somos responsáveis por aceitar que, quando se cria uma entidade reguladora. é porque se sabe que não existe concorrência, não é para a garantir, quando já se sabe que isso não é possivel. Somos responsáveis por nos iludirmos, ao sentirmo-nos mais seguros só porque existe um regulador.
Este é o momento de encontrar um desígnio para Portugal. Saber o que os portugueses querem de Portugal e como querem o seu Portugal, entendendo portanto que neste momento esta é uma missão de que depende a sobrevivência que tem que ser assumida.
Nesse sentido recomendaria que os politicos de forma clara digam aos portugueses que só se propõem gastar aquilo que for possivel receber dos impostos. Sabendo aquilo que vai receber, um governo, qualquer que ele seja, deve fazer um orçamento para as despesas equilibrado com as receitas reais. Isto é aquilo que todas as famílias fazem porque têm que o fazer com seriedade, para serem reconhecidos como crediveis. Não é diferente com um governo. Com um orçamento, preferivelmente de saldo zero, já que não será possivel torná-lo positivo, poderíamos dar a escolher aos portugueses se querem que se aumentem os impostos do Estado ou se, pelo contrário, querem menos impostos, obrigando o Estado a reduzir a sua despesa.
Meus caros Portugueses
Os gastos do Estado são os nossos gastos e a solidariedade do Estado é a nossa solidariedade. Este discurso não é para os ricos nem para os pobres quer eles sejam jovens ou reformados. Este discurso é para todos aqueles que não querem viver na ilusão e pretendem assumir as suas responsabilidades, para ter um país que seja o reflexo de um povo que assume as suas responsabilidades.
Por: Paulo Pinto está no mercado de capitais desde 1985. Foi fundador da Associação de Investidores ATM, é seu actual vice-presidente e é co-autor do livro “Análise técnica - um instrumento fundamental”, publicado pelo Euronext. É o patriarca da análise técnica em Portugal e um grande promotor da sua divulgação. É administrador da Dif broker.